POR JULIANA ARREGUY (O GLOBO)
SÃO PAULO – Uma tecnologia que promete maior rapidez e eficácia nos diagnósticos de câncer pode reduzir os efeitos colaterais da radioterapia. É o que apostam a Microsoft e o Grupo Oncoclínicas, especializado em oncologia, que desenvolvem, em parceria, sistemas que devem agilizar os tratamentos de radioterapia e também na quimioterapia no Brasil.
O diagnóstico do câncer é um processo que passa por muitas etapas. Após a bateria de exames necessária para detectar o tumor, o médico precisa observar níveis de certas substâncias no organismo que ajudam a identificar a doença. Ao avaliar a dosagem, ele fará um cálculo para determinar o limite para os índices — chamados “pontos de corte” — e reconhecer se o tumor representa um câncer. A definição do corte é o que determina a dosagem da medicação utilizada no tratamento.
A tecnologia prometida pelas empresas para o auxílio à radioterapia deve acelerar a definição do ponto de corte: a máquina analisará os exames e fará os cálculos em três minutos; atualmente, o processo demanda 40 minutos de um especialista.
— Isso elimina qualquer potencial erro humano — disse Carlos Andrade, médico oncologista e diretor da Oncoclínicas, rede de clínicas particulares que trata pacientes com a doença.
Andrade acredita que cálculos feitos pela máquina podem “prevenir da melhor forma os efeitos colaterais” e garantir o efeito dos remédios apenas sobre a região que necessita de tratamento, protegendo outros órgãos que seriam afetados pela medicação.
O sistema no campo da quimioterapia atuará de outra forma: ao invés de focar na identificação do câncer, deve sugerir terapias aos casos já diagnosticados com base em tratamentos anteriores. Para aprimorar a máquina, a parceria foi estendida ao Centro de Estudos Sociedade e Tecnologia da Universidade de São Paulo (CEST/USP), que estudará quais são as melhores tecnologias para viabilizar o projeto.
— Queremos trabalhar a diversidade da terapia para um mesmo diagnóstico. Todos já fomos pacientes em um hospital e sabemos que é importante consultar uma segunda opinião — explicou o professor Luiz Natal, coordenador do projeto.
O sistema consiste em um banco de dados onde os médicos podem consultar a melhor forma de tratamento para determinado câncer a partir de outros casos registrados. O software será alimentado com pesquisas públicas e informações fornecidas por clínicas parceiras, embora a Microsoft garanta que não ocorrerá violação de sigilo dos pacientes.
— A nossa ideia é aproveitar os dados que a Oncoclínicas têm e juntar com protocolos disponíveis publicamente para criar correlações em determinados pacientes e formas de tratamento — declarou Fabio Scopeta, diretor de Transformação Digital da Microsoft na América Latina.
SEM SUBSTITUIÇÕES
As tecnologias foram pensadas para auxiliar os médicos e não para substituí-los, segundo Carlos Andrade.
— Ter um robô fazendo cirurgia não faz com que ele ocupe o lugar do médico. Ele só faz algumas tarefas de forma mais rápida e precisa do que um cirurgião poderia fazer a com a mão — explicou.
O professor Luiz Natal defendeu que o software pode fornecer aos hospitais uma oportunidade de suporte ao trabalho de pesquisa sem substituir o diagnóstico feito por um profissional da área.
— Você tem uma base de conhecimento gerada por experiências anteriores e que lança uma probabilidade. Mas a última opinião sempre é do médico especialista.
O projeto para a radioterapia está em fase de testes desde junho apenas em clínicas do Rio de Janeiro – atualmente, a Oncoclínicas atua em dez estados brasileiros. A expectativa é que possa ser utilizado pelos médicos ainda este ano. Já o sistema voltado para o tratamento quimioterápico se encontra em “fase embrionária”, segundo o professor da USP. As pesquisas coordenadas pela universidade tiveram início em julho, sem uma previsão de entrega do projeto. A Microsoft, por sua vez, acredita que conseguirá lançá-lo em “meados de 2019.”