O Brasil é hoje uma referência internacional em excelência médica e hospitalar, o que inclusive vem fomentando a vinda de estrangeiros para aqui se tratar em áreas de alta complexidade.
Diante deste contexto, a Federação Brasileira de Hospitais vê com preocupação a forma como mais uma vez foi divulgado o estudo sobre incidência de eventos adversos como causa mortis em altas hospitalares. Tal estudo, que incialmente tinha sido desenvolvido pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), foi agora divulgado através de parceria com uma instituição de ensino privada e novamente patrocinado pelas operadoras de saúde, por meio do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS).
Com relação a este estudo, a Federação Brasileira de Hospitais esclarece que:
- Consideramos de fundamental importância o estudo de eventos adversos, como parte do compromisso e do esforço para garantir segurança clínica e melhoria dos processos hospitalares de atenção à saúde;
- Os hospitais brasileiros, por conta disso, vem cada vez mais investindo em protocolos de segurança clínica e buscando aperfeiçoamento através de certificados de qualificação (acreditações)
- Apesar da divulgação priorizar o alarmismo não há motivos para isso. O problema da ocorrência de eventos adversos é um fenômeno mundial que vem sendo combatido por todos os países a cada dia. É importante notar, no entanto, que os dados apresentados para eventos adversos em hospitais brasileiros de 6,4% para hospitais públicos e 7,1% para hospitais privados, não destoa das médias mundiais conforme demostra a literatura sobre o tema resumida a seguir:
Estudo | % eventos adversos |
Harvard Medical Practice Study, United States (Brennan et al.,1991) | 3.7% |
Quality in Australian Health Care Study (Wilson et al., 1995) | 16.6% |
Adverse Events in British Hospitals (Vincent et al., 2001) | De 10.8% a 11.7% |
Danish adverse events Study (Schiøler et al., 2001) | 9.0% |
Canadian Adverse Events Study (Baker et al., 2004) | 7.5% |
Spanish National Study of Adverse Events (Aranaz-Andrés et al.,2008) | 8.4% |
Systematic review of eight studies in
Australia, Canada, New Zealand, United Kingdom, United States (de Vries et al., 2008) |
9.2% |
Incidence of Adverse Events in Swedish Hospitals (Soop et al., 2009) | 12.3% |
Adverse events and potentially preventable deaths in Dutch hospitals (Zegers et al., 2009) | 5.7% |
Nosocomial Infections in Belgium, part 2: Impact on Mortality and Costs (Vrijens et al, 2009) | 6.2% |
Irish National Adverse Events Study (Rafter et al., 2016) | 10.3% |
Fonte: OCDE[1]
- Lamenta-se ainda que o estudo tenha deixado de apresentar os potenciais impactos da verticalização em termos de ocorrência de eventos adversos, separando os resultados de hospitais que pertencem à operadoras de planos de saúde (hoje estimados em aproximadamente 40% dos leitos privados), daqueles hospitais que são independentes. Uma investigação científica interessante seria mostrar se a presença de incentivos econômicos de redução de custos alinhados entre as operadoras de planos de saúde e seus respectivos hospitais, afetaria as taxas de eventos adversos.
- Por fim causa estranheza que um estudo que se propõe a jogar luz na questão da qualidade assistencial defenda o afrouxamento das regras para mudança de rede hospitalar previstas pela Lei 9.656/98.
A Federação Brasileira de Hospitais, entidade que representa o setor há 50 anos, considera igualmente importante que se investigue os impactos causados pela burocracia administrativa dos intermediários financeiros, que provocam impacto no cuidado dos pacientes e que se tornam evidentes na explosão da judicialização verificada no Brasil. Além disso consideramos de igual importância que se meça eventos adversos causados pela ausência de estratégias e de adequada gestão da saúde das pessoas nas suas mais diversas matizes e, em especial, no cuidado preventivo e na coordenação da assistência que é hoje, na maioria das vezes, fragmentada e ineficiente.
Em síntese, trata-se de um assunto grave, cuja divulgação na mídia deve ser feita com cautela e responsabilidade para evitar alarmes desnecessários que tumultuam o processo de evolução da segurança clínica. Por fim, o setor hospitalar faz um convite às operadoras de saúde, à classe médica, aos laboratórios e clínicas para que juntos realizem novas investigações sobre esses e outros assuntos em prol da segurança clínica, para fortalecer as conquistas obtidas por nosso país como referência internacional em excelência médica e hospitalar.