SÃO PAULO. Botões de elevador, teclas de caixas eletrônicos, relógio de ponto biométrico. Locais aparentemente inofensivos, se comparados a salas de isolamento, laboratórios e contêineres de lixo infectado, são, na verdade, porto seguro para uma miríade de micro-organismos que causam as temidas infecções hospitalares.
Foi utilizando uma tecnologia chamada “sequenciamento de nova geração” que uma equipe do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo (IMT), da USP, conseguiu identificar uma quantidade surpreendente de bactérias em superfícies frequentemente tocadas com as mãos dentro do Hospital das Clínicas (HC), maior complexo hospitalar da América Latina, ligado à Faculdade de Medicina (FM) da USP.
Métodos modernos de biologia molecular, com equipamentos que conseguem ler rapidamente milhões de fragmentos de DNA ao mesmo tempo, permitem análises antes impossíveis de serem feitas.
Assim, o grupo liderado pelo pesquisador Sabri Sanabani coletou amostras que resultaram na identificação de 926 famílias de 2.832 gêneros de bactérias. Algumas delas, como a Salmonella enterica e a Staphylococcus aureus, podem representar um risco, inclusive, para pessoas saudáveis, como os familiares e servidores, “mas são especialmente perigosas para os pacientes imunocomprometidos, como aqueles com câncer submetidos a quimioterapia, e transplantados e pacientes que são HIV positivo”, ressalta.
Segundo Sanabani, pela própria metodologia utilizada, sabia-se de antemão que o resultado seria um número grande de bactérias, já que o foco eram superfícies de contato de áreas de grande circulação. “No entanto, a enorme diversidade de população bacteriana foi uma verdadeira surpresa para nós”, afirma.
Os resultados do estudo, publicados no “International Journal of Environmental Research and Public Health”, foram encaminhados ao Hospital das Clínicas, e a equipe já se colocou à disposição para fazer as análises novamente para avaliar melhoras na higiene.
Saúde pública. O pesquisador explica que é impossível haver um hospital livre de germes, mas aponta caminhos, como campanhas educativas que alertem sobre higiene. Ele sugere, por exemplo, uma voz automatizada nos principais ambientes do hospital, como corredores, salas de espera e pronto-atendimento, que chame a atenção para a importância da higiene das mãos.
Outra medida básica apontada pelo especialista é a limpeza. “A limpeza completa e eficiente remove mais de 90% dos micro-organismos. Ela tem que ser realizada de uma forma padronizada ou, se possível, por meios automatizados para garantir um nível adequado de higienização”.
Segundo Sanabani, um ponto fundamental é que exista ampla oferta de pias com sabão líquido e papel-toalha, bem como álcool antisséptico.
Estatísticas
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), infecções hospitalares atingem cerca de 14% dos pacientes.
Apenas no Brasil, o problema é responsável por mais de 100 mil mortes todos os anos.
Embora possa ocorrer em qualquer paciente, idosos, pessoas com problemas neurológicos e com imunidade reduzida são mais propensos.
Higienização ou até mesmo reforma
A pesquisa chama a atenção para a necessidade de compreender melhor as comunidades de bactérias nos hospitais e de investigar como esses agentes são transmitidos de lugar para lugar e de pessoa para pessoa. “É extremamente importante ter um estudo como esse realizado pelo nosso grupo, para podermos avaliar o estado atual dos ambientes hospitalares e identificar as áreas que se beneficiariam mais com uma higienização completa ou, em casos específicos, uma reforma”.
A pesquisa sobre contaminação em ambiente hospitalar foi pontual, já que a investigação é mais ampla e quer explorar toda população bacteriana que possa representar perigo para a saúde pública. “E estamos planejando iniciar um estudo para investigar o microbioma no sistema de ar-condicionado nas diferentes linhas de metrô”, adianta Sabri Sanabani.
Fonte: O Tempo – MG (03/05/2017)